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27 outubro, 2011

Nova História: O Leão Marajá e a Tartaruga Turra

Há muito tempo atrás lá para os lados da Ásia existia uma floresta separada do resto do mundo. Olímpia era um lugar reservado e mantido em segredo do resto do planeta Terra. Conta a história que um dia, já cansado de tantas guerras e destruição o velho das montanhas mais altas do mundo decidiu começar tudo de novo. Partiu em cima do seu amigo burro, levando com ele a bagagem acumulada ao longo dos anos. Por onde passava havia sempre algum animal (as pessoas não eram muito dadas a grandes aventuras) que lhe perguntava: - Para onde vais? Ele respondia sempre o mesmo: - Vou começar um mundo novo e mágico. Sempre que isto acontecia, um animal passava a acompanhá-lo. Quando chegou ao seu destino havia elefantes, girafas, pinguins, lémures, ratos, focas, tigres, leões, cobras e muitos outros animais. Mas adivinhava-se uma grande confusão neste lugar e o velho resolveu reunir todos para em conjunto elaborarem a Lei da Paz e do Sossego. Constava neste documento que estava expressamente proibido que os animais se comessem uns aos outros. No principio ficaram um pouco confusos, principalmente os que andavam sempre atrás dos coelhos e dos veados. Mas o velho tinha uma solução – mágica. Da sua sacola retirou umas sementes enormes e brilhantes. Espalhou-as pela terra e subitamente brotaram árvores repletas de frutos muito estranhos.
Dessas árvores gigantes caíam diariamente frutos de diversas cores e cada animal já sabia o que comer. Por exemplo, o tigre comia os pedaços vermelhos, com sabor a carne; o veado comia os de cor verde (com sabor a erva e folhas fresquinhas); o pinguim (que vivia nas rochas do mar gelado) petiscava as sementes com sabor a peixe...e todos os dias as árvores se renovavam. Não havia separações entre eles, pois naquele lugar todos tinham a sua casa com tudo o que precisavam. Não havia lutas e nenhum animal se sentia em perigo ou era ameaçado pelos outros. E tudo correu bem até ao dia em que o Leão Marajá acordando mal disposto, a cauda a agitar rapidamente e rugindo bem alto disse:
- Estou cheio de fome, cheio de fome – quero comer muito, até não aguentar mais; afinal quem é o maior e mais forte de todos os animais? Claro que sou eu. Não tenho que obedecer a um velho que acha que manda em toda esta floresta. A partir de agora iremos ver quem é que irá reinar! Sacudiu a juba escura e saiu de casa.

Aquele lugar que outrora era pacífico tornou-se amedrontador. Emboscada atrás de emboscada Marajá capturava o que era apetitoso e lhe satisfazia a gula. Os habitantes passaram a sair de casa somente à noite, pois era o único momento em que de barriga repleta, o leão adormecia num longo ronco. Quando se dirigiram ao velho que os trouxera para ali ele sabiamente murmurou: - Marajá terá o castigo que merece; reuniremos na próxima noite de lua cheia junto ao lago de fogo (de certo, o leão tinha pavor de fogueiras e nunca se aproximaria dali). Apesar do medo e da desconfiança todos respeitaram as palavras do velho das montanhas mais altas do mundo. Quando certa noite a lua iluminou o céu todos correram para o lugar marcado – não havia tempo a perder. Mal o velho falou as primeiras palavras todos se calaram num silêncio absoluto (exceto o ronco do leão que descansava do repasto). Disse ele:
- Meus companheiros e companheiras, sempre desejei viver num sítio em que a harmonia fosse o mais importante; onde a paz e o sossego fosse o sonho de todos. Mas como sempre, há alguém que com o seu egoísmo está a tentar estragar os nossos planos. Por isso está na hora de lhe ser dada uma lição.
Sem grandes explicações o velho pediu aos habitantes que arranjassem comida e água para uma semana e se mantivessem em casa.
Assim, quando na manhã seguinte o Leão Marajá saiu para caçar achou muito estranho toda aquela tranquilidade; nada parecia mexer-se e não havia nem um mísero ratinho a correr para que lhe saltasse em cima e o comesse de uma só vez. Bem amanhã será diferente, pensou ele. Mas não foi. Todos os dias que se seguiram foram exatamente iguais a essa manhã. Então passou a ouvir-se um outro ronco: o ronco de fome que provinha do seu estômago.
Passados 5 dias já Marajá andava desesperado de um lado para o outro, gemendo: - ai, ai que vou morrer de tanta fome que tenho, ai, ai, ai. Foi então que a Tartaruga Turra (caminhando muito devagarinho) foi ter com ele.
Ela disse:
- Olá Marajá o que se repassa contigo que só te oiço gritar e chorar?
- Grrrrr, estou cheio de fome e não há nada para caçar.
- Já pensaste em comer o que todos nós comemos desde que aqui chegamos?
- Nem pensar; eu sou um leão destemido e sempre cheio de fome: tenho que comer trinta quilos de carne por dia; não quero saber de ser amigo dos meus alimentos; ninguém manda em mim porque eu sou o Rei da floresta.
- Então só te resta uma solução...
- Qual, tartaruga Turra?
- Comeres-me a mim.
-Hummm, uma tartaruga?
- Tenho uma carninha muito tenrinha e saborosa, sabias?
- Hummmm
A boca de Marajá encheu-se de água com o pensamento de poder saborear uma refeição tão requintada. Sem pensar muito saltou para cima da tartaruga. Mas nesse mesmo instante Turra enfiou-se dentro da sua carapaça (dura como pedra) e assim que Marajá, com os seus dentes afiados a mordeu sentiu uma dor enorme.

A tartaruga Turra não conseguindo parar de se rir, disse-lhe:
- Marajá, és o primeiro Leão desdentado que conheço!

A partir desse dia, o Leão Marajá passou a comer todos os dias os frutos vermelhos que caiam das árvores e o velho das montanhas sentiu finalmente que o seu sonho se tinha tornado realidade.


Publicada na Revista Coisas de Criança.

Ilustração de Patricia Sousa.