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10 março, 2011

Nova História: As travessuras de Lili.

















Saiu em Março / 2011 - Revista Coisas de Criança
Ilustração de Patricia Sousa.

Lili -como quase todas as meninas e meninos pequenos - andava no infantário, na sala dos cinco anos. Tinha entrado naquele ano para a mini-escola - que é a escola dos que têm menos de seis anos- pois até então tinha ficado em casa da avó Júlia, enquanto os pais iam trabalhar. Mas Lili era muito travessa e nem a avó com toda a paciência da sua idade tinha já energia para tanta brincadeira. Achavam os pais que a menina precisava de conhecer outras crianças da sua idade e por isso inscreveram-na no Infantário dos Sorrisos. Entrava às oito e meia da manhã e o seu pai vinha buscá-la no final da tarde. Este, mal chegava à escola, ouvia as queixas infindáveis sobre o comportamento da filha: “beliscou o João”, “entornou a sopa por cima da bata da Catarina”, “assustou o Pedro com uma mosca morta”, “deitou abaixo a torre que algumas das crianças construiam na sala”, enfim, um sem número de asneiras e malvadezas. Lili divertia-se com estas travessuras e quando lhe ralhavam colocava aquele ar de menina boazinha, acabando os adultos por lhe perdoar , na esperança que o arrependimento fosse duradouro. Mas, todos os dias as queixas se repetiam. Tinham passado quatro meses desde a sua entrada para a mini-escola, quando uma manhã Lili se recusou a ir para o Infantário. No meio de lágrimas e soluços, balbuciava que ninguém queria brincar com ela. Ninguém me empresta os brinquedos e a Sofia e o André dizem que eu sou muito má – lamentava-se ela. A mãe tentava explicar-lhe que ela devia ser mais amiga das outras crianças, pois nem sempre as suas partidas tinham piada. Era em vão - Lili não percebia muito bem o que a mãe lhe dizia, pois segundo ela, eram apenas brincadeiras. Então passou a atrasar a sua ida para o infantário - escondia-se debaixo da cama ou dentro do armário, chorava, recusava-se a tomar o pequeno-almoço e chorava todas as manhãs. Foi então que um dia ao acordar – ainda cheia de sono - algo inesperado aconteceu. Debaixo dos lençois ouviu uma voz dizer: “Lili cara de chantilly”, “Lili cheira a camisola rota”, Lili cara de sapato”, Lili anda aqui”. Aquilo parecia-lhe familiar, mesmo muito familiar. Às vezes também fazia essa brincadeira na escola dos pequeninos. Surpreendida e um pouco chateada, saiu da cama. Começou a andar pelo quarto dizendo - hei, eu não tenho cara de chantilly, nem cara de sapato e muito menos cheiro a camisolas rotas. Mal acabou de dizer estas palavras, um pé passou-lhe uma rasteira e ela caiu ao chão. Levantou-se muito zangada e à sua frente estava um menino a rir-se às gargalhadas. Nem queria acreditar no que via.
- És muito mau. Vou dizer à minha mãe e ela vai por-te de castigo – disse Lili.
- Podiamos brincar juntos, retorquiu Gaspar, ignorando o que ela dizia.
- Brincar? Ainda agora me fizeste cair e gozaste comigo; não gosto nada disso, respondeu Lili.
Então Gaspar com um sorriso maroto nos lábios disse-lhe:
- Então somos iguais, pois por aquilo que sei ninguém quer brincar contigo na escola, exactamente pelos mesmos motivos. Estas palavras deixaram a menina em silêncio; após pensar um pouco murmurou envergonhada:
- Está bem. Podemos brincar juntos mas sempre que me pregares alguma partida, faço-te desaparecer.
Foi assim que aos 5 anos de idade Lili encontrou um amigo muito especial: um amigo mágico – só Lili o conseguia ver. Aparecia e desaparecia num abrir e fechar dos olhos. Em pouco tempo, Gaspar tornou-se o companheiro de todas as aventuras da menina ruiva e rechonchuda.E naquela manhã – de sol - quando a menina saiu do quarto para ir tomar o pequeno-almoço, pediu à mãe um saco de caramelos para dar aos meninos e meninas da sua sala dos cinco anos.

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